O mundo mudou muito nos últimos 500
anos. A tecnologia rudimentar utillizada pelos homens evoluiu rapidamente com a
revolução industrial e tecnológica que nos trouxe máquinas de grande porte,
além de permitir a transmissão de
energia elétrica e a disseminação dos sistemas de comunicação ao redor do
planeta. Essas grandes revoluções tiveram forte impacto na vida dos grupos
humanos tornando mais veloz a comunicação e a profusão de saberes.
Grande parte da sociedade dita
brasileira é uma das que mais têm acesso aos meios comunicação como internet no
mundo e nosso país apresenta um dos
maiores número de linhas de celular ativas. Contudo, ainda nos achamos no
direito de vetar os recursos tecnológicos aos nossos irmãos nativos, aos
indígenas. Muitas vezes ouvimos o
discurso de que “índio que usa celular não é índio”, que “os grupos indígenas
deveriam estar na floresta”. Contudo, sem acesso às novas formas tecnologia como as
comunidades indígenas poderão lutar pelos seus direitos? Como poderão registrar
seus cantos e danças? Como poderão unir suas tecnologias ancestrais com as
atuais?
Durante a invasão à aldeia Maracanã
muitas pessoas, com acesso aos meios de formação e comunicação, repetiram o discurso
acima, de que lugar de índio é na floresta. Fiquei muito assustada quando li
neste sábado, dia 23 de março, uma matéria do jornal GLOBO ao ressaltar que um
dos manifestantes da aldeia Maracanã, apesar de índio, morava na Tijuca e era
formado em história e antropologia, como se a formação acadêmica ou o fato dele
morar na cidade o descaracterizasse como indivíduo indígena. Como podemos ainda
pensar dessa forma? As populações nativas têm os mesmos direitos à cidadania
como qualquer outro cidadão dito brasileiro.
Nem entrarei aqui no mérito de vários grupos indígenas, como os Guarani-Kaiwoa,
que mesmo morando em área não-urbana também têm seu território imemorial
invadido. O que me espanta é a ignorância de muitas pessoas que ainda acreditam
ser viável e legítimo o congelamento social e cultural de grupos humanos.
Exibição de vídeo sobre o ritual tradicional promovido pela equipe PRODOCLIN|Karajá |
O Projeto de Documentação da Língua
e Cultura Karajá caminha na corrente oposta. Acreditamos que é fundamental o
acesso aos meios de comunicação e formação acadêmica aos povos indígenas, pensamos
que estes grupos étnicos devem fazer parte do processo de crescimento da nação
chamada Brasil. No âmbito do Projeto, procuramos promover oficinas de
capacitação visando gravação de áudio e vídeo, fotografia e manuseio de
softwares para anotação linguística.
Pesquisadora Chang Whan demonstra utilização de câmera de vídeo durante oficina de documentação em Hawalò (TO) |
Linguístas Luiz Amaral, Marcus Maia e Cristiane Oliveira promovem Oficina de Produção de Material Didático para professores Karajá |
O PRODOCLIN|Karajá doou à aldeia
Hawalò (TO) uma câmera de vídeo semi-profissional, uma câmera de fotografia
profissional, um gravador de áudio Zoom e um laptop HP com softwares de
anotação linguística desenvolvidos por grandes institutos preocupados com a
documentação de línguas ameaçadas. Estes equipamentos são utilizados pelos
pesquisadores indígenas para registro de cantos, danças, rituais e qualquer
outra forma de manisfestação linguística e cultural. Além disso, a equipe se
reúne mensalmente por email, ou por meio do software Skype para dar
continuidade aos trabalhos de documentação e análise da língua e cultura Iny
(Karajá).
Mawysi e Hatawaki durante treinamento de vídeo em Oficina de Documentação promovida pelo PRODOCLIN (RJ) |
Mawysi e Hatawaki durante treinamento de áudio em Oficina de Documentação promovida pelo PRODOCLIN (RJ) |
Pesquisador Axiawa durante treinamento com softwares de anotação linguística em São Félix do Araguaia (MT) |
Pesquisador Juahanu em momento de captura de vídeo em Bàtoiry (TO) |
O mundo e as pessoas estão em
constante movimento não há como paralisar uma língua ou uma cultura. Devemos
ter em mente que o acesso à informação, à educação e à cidadania é um direito
de todos e deve ser assegurado a todos aqueles que vivem nesta terra.
Criança Karajá se familiariza com equipamento de vídeo |
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Cristiane Oliveira, coordenadora do PRODOCLIN|Karajá