segunda-feira, 25 de março de 2013

Por que o índio urbano incomoda tanta gente?



O mundo mudou muito nos últimos 500 anos. A tecnologia rudimentar utillizada pelos homens evoluiu rapidamente com a revolução industrial e tecnológica que nos trouxe máquinas de grande porte, além de  permitir a transmissão de energia elétrica e a disseminação dos sistemas de comunicação ao redor do planeta. Essas grandes revoluções tiveram forte impacto na vida dos grupos humanos tornando mais veloz a comunicação e a profusão de saberes.

Grande parte da sociedade dita brasileira é uma das que mais têm acesso aos meios comunicação como internet no mundo e nosso país apresenta um dos  maiores número de linhas de celular ativas. Contudo, ainda nos achamos no direito de vetar os recursos tecnológicos aos nossos irmãos nativos, aos indígenas.  Muitas vezes ouvimos o discurso de que “índio que usa celular não é índio”, que “os grupos indígenas deveriam estar na floresta”. Contudo, sem acesso  às novas formas tecnologia como as comunidades indígenas poderão lutar pelos seus direitos? Como poderão registrar seus cantos e danças? Como poderão unir suas tecnologias ancestrais com as atuais? 

Durante a invasão à aldeia Maracanã muitas pessoas, com acesso aos meios de formação e comunicação, repetiram o discurso acima, de que lugar de índio é na floresta. Fiquei muito assustada quando li neste sábado, dia 23 de março, uma matéria do jornal GLOBO ao ressaltar que um dos manifestantes da aldeia Maracanã, apesar de índio, morava na Tijuca e era formado em história e antropologia, como se a formação acadêmica ou o fato dele morar na cidade o descaracterizasse como indivíduo indígena. Como podemos ainda pensar dessa forma? As populações nativas têm os mesmos direitos à cidadania como  qualquer outro cidadão dito brasileiro. Nem entrarei aqui no mérito de vários grupos indígenas, como os Guarani-Kaiwoa, que mesmo morando em área não-urbana também têm seu território imemorial invadido. O que me espanta é a ignorância de muitas pessoas que ainda acreditam ser viável e legítimo o congelamento social e cultural de grupos humanos. 
Exibição de vídeo sobre o ritual tradicional promovido pela equipe PRODOCLIN|Karajá
 
O Projeto de Documentação da Língua e Cultura Karajá caminha na corrente oposta. Acreditamos que é fundamental o acesso aos meios de comunicação e formação acadêmica aos povos indígenas, pensamos que estes grupos étnicos devem fazer parte do processo de crescimento da nação chamada Brasil. No âmbito do Projeto, procuramos promover oficinas de capacitação visando gravação de áudio e vídeo, fotografia e manuseio de softwares para anotação linguística.

Pesquisadora Chang Whan demonstra utilização de câmera de vídeo durante oficina de documentação em Hawalò (TO)

Linguístas Luiz Amaral, Marcus Maia e Cristiane Oliveira promovem Oficina de Produção de Material Didático para professores Karajá

O PRODOCLIN|Karajá doou à aldeia Hawalò (TO) uma câmera de vídeo semi-profissional, uma câmera de fotografia profissional, um gravador de áudio Zoom e um laptop HP com softwares de anotação linguística desenvolvidos por grandes institutos preocupados com a documentação de línguas ameaçadas. Estes equipamentos são utilizados pelos pesquisadores indígenas para registro de cantos, danças, rituais e qualquer outra forma de manisfestação linguística e cultural. Além disso, a equipe se reúne mensalmente por email, ou por meio do software Skype para dar continuidade aos trabalhos de documentação e análise da língua e cultura Iny (Karajá).

Mawysi e Hatawaki durante treinamento de vídeo em Oficina de Documentação promovida pelo PRODOCLIN (RJ)

Mawysi e Hatawaki durante treinamento de áudio em Oficina de Documentação promovida pelo PRODOCLIN (RJ)

Pesquisador Axiawa durante treinamento com softwares de anotação linguística em São Félix do Araguaia (MT)

Pesquisador Juahanu em momento de captura de vídeo em Bàtoiry (TO)
O mundo e as pessoas estão em constante movimento não há como paralisar uma língua ou uma cultura. Devemos ter em mente que o acesso à informação, à educação e à cidadania é um direito de todos e deve ser assegurado a todos aqueles que vivem nesta terra.

Criança Karajá se familiariza com equipamento de vídeo
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 Cristiane Oliveira, coordenadora do PRODOCLIN|Karajá

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